Uma Ética Transformadora

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

O professor Dr. Júlio Zabatiero diz que a ética brasileira está marcada por uma intensa ambiguidade: o reconhecimento de que devemos ser “diferentes” é acompanhado pelo conservadorismo moral nos âmbitos social e político, que não nos permite fazer essa “diferença” ir muito além do que costumamos chamar de testemunho pessoal. Tratando das mutações recentes na moralidade de evangélicos no Brasil, notou-se, claramente, que a moral assumiu mais a forma de um código de regras do que uma obediência a Deus para uma vida ética ligada à espiritualidade e teologia. A ética dos brasileiros se tornou individual de cumprimento de deveres.

A nova valorização da dimensão sócio-política da ética cristã, abordada em um de seus textos sobre o tema, diz que a assistência social e participação política ainda eram vistos como expressão da missão (integral), e não como expressão da ética. Cabe aqui, então, relembrar Ricardo Quadros Gouvêa¹ quando escreve que missão integral não é “estratégia de evangelização”, “ministério de ação social”, “teoria missiológica”, “diaconia”, “teologia da libertação”; mas sim: “teologia bíblica do Evangelho”, “interpretação da Grande Comissão à luz do mandato sócio-cultural”, “missão da Igreja e a Teologia que serve à Igreja”, “o próprio Evangelho”.

Infelizmente precisamos concordar que os evangélicos não têm um projeto para o Brasil, tão somente para suas comunidades fechadas. Os evangélicos (não generalizando, mas em sua esmagadora maioria) estão, em sua práxis, desassemelhados com a verdadeira missão integral e cada vez trancafiados para auxiliarem a si mesmos. Isto se dá pela individualidade que ela própria tem alimentado nos templos, mormente, neopentecostais. No lugar de membresia, rotatividade exacerbada em busca de um deus (algo) funcional. Por isso, a "santidade" vai se tornando, como se tornou, um dever. Desenvolveu-se a ideia de santidade a partir da oposição ao comportamento cotidiano dos brasileiros. Não tem nada de contextualização, e sim, uma pseudo-imagem de ética (ou na linguagem destes, a própria santidade) religiosa. Isso tudo para tentarem manter “comunhão” com um “d”eus que tudo pede e tudo dá e o “relacionamento espiritual” está cada vez mais vertical e esotérico, exatamente o inverso proposto pelo Cristo.

Condoídos pelos que se perdem, é-nos pertinente abraçar a construção de uma ética da liberdade em amor, que fora esboçada pelo Dr. Zabatiero através de: a) uma cristologia da liberdade: um olhar aberto para a ação fidedigna de Cristo, mediante a qual a humanidade é liberta; b) uma ética da liberdade em amor: sobre a fonte da prática do bem a favor do outro, da pessoa necessitada; c) identidade cristã e a ética da liberdade: onde a identidade cristã se configura no futuro que se fez história em Jesus.
Concluímos pensando na antológica frase de Fernando Pessoa: “Humano como ele (Jesus) era, só podia ser Deus”. Envolver-se com um amor abnegado, humano, sem buscar encher-se de Deus, antes, deixar-se plenamente humano. Um dos tantos alvos preferidos da igreja evangélica é a busca pela sua divinização, enquanto Jesus deixa-se ler pelo kenósis. O esvaziamento é a porta de entrada para um casamento entre a teologia, a espiritualidade e a ética.

Por: Nelson Lellis

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¹ Missão Integral – Um Convite à Reflexão. Fonte: http://www.ftl.org.br

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